Há dois anos escrevi sobre a comemoração dos 29 anos do Código de Defesa do Consumidor, iniciando o texto com a afirmação feita por John Kennedy, em seu famoso discurso feito na Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), em 15 de março de 1962: “consumidores somos todos nós”.
Por isso, o dia 15 de março foi consagrado como o Dia Mundial dos Direitos do Consumidor, celebrado, inicialmente, em 15 de março de 1983, mas, apenas em 1985, a (ONU) adotou os Direitos do Consumidor como Diretrizes das Nações Unidas, o que lhe deu legitimidade e reconhecimento internacional.
Desde então e antes da promulgação da Constituição Federal de 1988, o Conselho Nacional de Defesa do Consumidor constituiu uma comissão composta por notáveis juristas visando apresentar o Anteprojeto de Código de Defesa do Consumidor nos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte.
Promulgada a nossa Constituição em 1988, houve a expressa previsão da defesa dos consumidores pelo Estado, como direito e garantia fundamental – art. 5º, XXXII, e como princípio geral da atividade econômica – art. 170, ambos do texto constitucional. Ainda, art. 48 das Disposições Transitórias do texto constitucional – ADCT – disciplinou que “o Congresso Nacional, dentro de 120 dias da promulgação da Constituição, elaborará o Código de Defesa do Consumidor”. E assim, mesmo que não observado o prazo do mencionado art. 48, a Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 – Código de Defesa do Consumidor, lei de ordem pública e interesse social e que entrou em vigor em 11 de março de 1991.
Como afirmei há dois anos, nós, os consumidores, somos privilegiados porque a nossa defesa está prevista na Constituição Federal e temos uma legislação infraconstitucional moderna, que se relaciona com as diversas disciplinas jurídicas – relação com o direito civil, direito processual, direito administrativo, direito empresarial, direito da concorrência, propriedade industrial, proteção das marcas, direito do autor, livre concorrência, meio ambiente, LGPD, sem contar com a sua interação com as novas formas de contratação no mundo digital, mais do que sedimentada em nossos hábitos com a pandemia da COVID -19.
Aliás, quanto ao período pandêmico, o CDC embasou a nossa segurança jurídica nos contratos de prestação de serviços de educação, nos planos de saúde, nas compras on line, no turismo, enfim, conferiu aos cidadãos no período de sua maior vulnerabilidade a sua devida proteção (e lógico, ainda confere).
É certo que a nossa legislação consumerista, mesmo sendo uma lei moderna, inserta no sistema capitalista e que serviu e serve de modelo para o ordenamento de outros países, carece de atualizações. A primeira delas – Lei nº 14.1981, de 1º de julho de 2021 (lei do superendividamento), alterou o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso para aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento.
Ainda, nos deparamos com o desafio do comércio eletrônico, que não existia nas relações de consumo em 1990 e hoje tão corriqueiro por grande parte dos nossos consumidores.
Por outro lado, o CDC ainda prevê a contratação de fornecimento de produtos ou serviços que possam ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio, o que permite o direito de arrependimento pelo consumidor no prazo de sete dias (art. 49). Com isso, procuro ilustrar que o código prevê práticas de consumo que certamente parecem estar ultrapassadas, mas ocorrem muito em nosso país, especialmente nas regiões ribeirinhas, comunidades carentes, cidades distantes dos centros urbanos, o que traduz as grandes diferenças e desigualdades de acesso ao consumo e às suas práticas. Mas, isso é tema para outras reflexões.
“E que venham os 30 anos do Código de Defesa do Consumidor”. Foi assim que eu concluí o meu trabalho pela comemoração dos 29 anos do CDC e, da mesma forma, concluo os comentários de hoje: que venham os 31 anos, mas sempre com novos dados e conquistas pelos consumidores brasileiros, na defesa de seus direitos e da sua cidadania.
Andréa Horta Pegoraro – Advogada – Presidente da Comissão Permanente de Defesa do Consumidor da OAB/SP 242ª Subseção do Butantã – triênio atual 2022/2024) – Secretária Geral da OAB/SP 242ª Subseção do Butantã.